sábado, 1 de outubro de 2011

Denúncia Anônima e Ação Penal

Info 483 - 5a. Turma do STJ
DENÚNCIA ANÔNIMA. INQUÉRITO. FUNÇÃO. MP.
Conforme os autos, por meio de e-mail anônimo encaminhado à Ouvidoria-Geral do Ministério Público estadual, fiscais de renda e funcionários de determinada empresa estariam em conluio para obter informações de livros fiscais, reduzindo ou suprimindo tributos estaduais e obrigações acessórias, causando lesão ao erário. Em decorrência desse fato, o MP determinou a realização de diligências preliminares para a averiguação da veracidade do conteúdo da denúncia anônima. A Turma, reiterando jurisprudência assente no STJ, entendeu que, embora tais informações não sejam idôneas, por si só, a dar ensejo à instauração de inquérito policial, muito menos de deflagração de ação penal, caso sejam corroboradas por outros elementos de prova, dão legitimidade ao início do procedimento investigatório. Assim, no caso, não há nenhum impedimento para o prosseguimento da ação penal, muito menos qualquer ilicitude a contaminá-la, uma vez que o MP agiu em estrito cumprimento de suas funções. Ademais o Parquet, conforme entendimento da Quinta Turma deste Superior Tribunal, possui prerrogativa de instaurar procedimento administrativo de investigação e conduzir diligências investigatórias (art. 129, VI, VII, VIII e IX, da CF; art. 8º, § 2º, I, II, IV, V e VII, da LC n. 75/1993 e art. 26 da Lei n. 8.625/1993). Aduziu ainda que, hodiernamente, adotou-se o entendimento de que o MP possui legitimidade para proceder, diretamente, à colheita de elementos de convicção para subsidiar a propositura de ação penal, só lhe sendo vedada a presidência do inquérito, que compete à autoridade policial. Quanto à agravante do art. 12, II, da Lei n. 8.137/1990, não se deve aplicá-la ao caso, pois o próprio artigo restringe seu âmbito de incidência ao delito previsto nos arts. 1º, 2º, 4º, 5º e 7º da referida lei, excluindo expressamente o art. 3º da sua abrangência. Como no caso a imputação é a funcionário público, haveria bis in idem na imposição da mencionada agravante a fato que constitui elemento de crime funcional previsto no art. 3º, II, da Lei n. 8.137/1990. Precedentes citados: HC 159.466-ES, DJe 17/5/2010, e RHC 21.482-RS, DJe 12/4/2010. RHC 24.472-RJ, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 15/9/2011.

Comentário Pessoal: o anonimato é vedado pela Constituição Federal. Entretanto, a chamada "denúncia anônima"  teria admissão quando corroborada com provas/indícios surgidos através da  necessária verificação da procedência das informações, passando o MP a ter elementos de informações suficientes ao manejo da denúncia, instaurando, assim, o processo penal contra o indivíduo.
Logo, não cabe busca e apreensão deferida com base apenas em denúncia anônima. Não cabe denúncia pelo MP com base exclusivamente em denúncia anônima. Não cabe, assim, nenhum ato de persecução criminal contra o indivíduo com base exclusivamente em denúncia anônima. Não pode ser ela o único elemento para se afirmar ser determinada pessoa responsável por ato criminoso. Ela servirá exclusivamente para iniciar o procedimento investigatório da polícia, passando a ouvir pessoas, colher informações, testemunhos e objetos de interesse para a formação das peças de informações inerentes e necessárias à propositura da ação penal. Não pode a denúncia anônima ser o primeiro e único ato de investigação policial, assim como não pode servir para iniciar uma busca e apreensão e ser esta a única prova contra o indivíduo investigado.
Vivencio diariamente processos penais com busca domiciliar e pessoal deferidas pelos Juízes com base apenas no pedido do MP que narra, sempre em síntese, "que informações policiais dão conta da existência de prática criminosa em determinado local merecendo, pois, a ordem de busca domiciliar e pessoal contra fulano de tal, no local x ou y". Nenhuma pré-investigação formal se teve notícias para que tais dados fossem informados no pedido para o Juiz deferir a busca e apreensão penal. Simplesmente com base em "denúncias anônimas" ou com base em "informações policiais" defere-se ordem contra a liberdade individual do suposto investigado.
Com base na denúncia anônima, poderá a PM, no local dos fatos, realizar campana, observar os movimentos e, com a certeza necessária (sob pena de abuso de autoridade) adentrar no local e cessar as ações em estado de flagrância, encaminhando  o fato para a Delegacia para apreciação da Autoridade Policial (Delegado de Polícia) lavrando-se o Auto de prisão em Flagrante. 
Entendo que o correto e mais seguro para os policiais em atividade, em tais situações, seria reunir tais provas e, diante de requerimento ao MP buscar do Magistrado o competente mandado de busca, legitimando constitucionalmente a ação policial para adentrar no domicílio da pessoa identificada como autor de crime, favorecendo a correção dos atos e a judicialização da busca e da apreensão a ser realizada, fortalecendo o devido processo legal e a regra da inviolabilidade de domicílio. 
O que é comum ocorrer na prática, diante da denúncia anônima, policiais entrarem nas casas e, por mera sorte dos agentes, encontrarem objetos de crime, em situação de flagrante-delito, legitimando, assim, a invasão realizada no domicílio. 
Com o procedimento de judicializar essas incursões da polícia nas residências, através de ordem judicial de busca, evitar-se-ia possíveis abusos, legitimando em muito o trabalho correto da Polícia, do Ministério Público e do Judiciário. E nas situações de urgência, basta manter parte da equipe em campana e no cerco ao local e parte buscar dos órgãos competentes o necessário mandado para legitimar o ato de busca domiciliar e pessoal.
Porém, esta não é a regra na prática. O trabalho da defesa técnica é justamente o de por freio aos desvios processuais provocados por medidas equivocadas de Juízes e Promotores que, no interesse de "fazer justiça" acabam por permitir ilegalidades, o que não se pode permitir em um Estado Democrático de Direito.
A cautela como parâmetro para limitar o poder de punir do Estado é sempre bem vinda e fortalece a segurança das relações jurídicas e o atendimento do devido processo legal.

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